Terceiro dia
Vega de Valcarce - Cebreiro
Vega de Valcarce - Cebreiro
O
terceiro dia de caminhada foi na subida do Cebreiro. Este
trecho é considerado o segundo de maior dificuldade no Caminho
Francês, sendo mais difícil do que ele apenas a subida
dos Pirineus. Iniciei a caminhada bem cedo, por volta das 6:30
horas, com todos do grupo. Estava bem disposta, havia
descansado bastante no albergue em Vega de Valcarce.
Não
senti muita dificuldade, achei uma delícia a subida do
Cebreiro, apesar de muitos trechos com ladeiras íngremes.
Lembro que neste trajeto o caminho é exuberante: vales cheios
de flores, muito verde, ribeirinhos e pequenas cachoeiras, os
animais nos pastos dos campos da Galícia, as casinhas rústicas
e floridas dos campesinos .
Quando
chegamos no marco que indicava a fronteira entre os territórios
de Castela y Leon e a Galícia paramos para tirar fotos, pois a
chegada no território galego era um dos mais esperados
momentos.
Eu
continuava cantando e caminhando, caminhando e cantando, pois
tudo era muito prazeroso. Nesse trajeto cantei “Somewhere
over the rainbow “. A paisagem magnífica me inspirou e os
versos que falam de algum lugar além do arco-íris, onde
nossos sonhos podem se realizar, soaram bem naquele momento .
A
expectativa de chegar no povoado Pedrafita era muito grande,
pois este é um dos lugares mágicos do caminho. Dizem que
na Igreja de Nossa Senhora está um
símile do
cálice sagrado, utilizado por Jesus para tomar o vinho na
última ceia, junto com os 12 apóstolos, antes de ser
crucificado. O símile
do Cálice Sagrada
teria chegado até o Cebreiro através da Ordem dos Templários.
Portanto, o Cebreiro simboliza o Santo Graal dos Peregrinos, um
lugar emblemático.
Cheguei
junto com todos do grupo no povoado de Pedrafita. No momento
da chegada uma turma de estudantes pré-adolescentes, todos
uniformizados, percebendo que nosso grupo era de
brasileiros começaram a gritar o nome de um famoso jogador
de futebol do Brasil. Eu não sou muito chegada a idolatria
de astros do futebol, entretanto achei muito legal a atitude
amistosa dos adolescentes. As pessoas do nosso grupo que gostam
de futebol, também ficaram entusiasmadas com a recepção
calorosa dos estudantes.
Quando
chegamos no povoado Pedrafita, nos acomodamos em um hotel
bem típico, com paredes de pedras. Uma parte do nosso grupo preferiu ficar no albergue municipal, somente eu e outros três amigos ficamos hospedados em um hotel. Meu quarto no segundo
andar, parecia de uma casinha de contos de fadas. Da
janelinha perto da cama eu avistava as ruas do povoado, com o
movimento dos peregrinos e turistas. O dono do hotel era muito
parecido com meu irmão mais velho, já falecido. Pensei em
tirar uma foto dele, para mostrar a minha família, mas tive
um acesso de timidez e fiquei sem jeito de pedir isso a ele.
O
dia estava frio, com bastante névoa. Logo na chegada fiz um
breve passeio apreciando a beleza rústica das pallozas e
das construções de pedras. Fui na igreja para ver o cálice do Santo Milagre. O Cebreiro é pura
magia, há uma energia diferente por lá, parece que estamos
em outro mundo, num tempo distante .
Na
manhã do dia seguinte deixamos a aldeia de Pedrafita. Meu
coração ficou apertado no momento da saída, queria muito
ficar mais um dia ali, pelo menos mais algumas horas. Ainda
relutei com os companheiros do meu grupo, para sairmos mais
tarde e aproveitar o café da manhã em um dos restaurantes
típicos. Mas não acataram minha sugestão e saímos bem
cedo, com muita névoa. Eu estava gripada e sair naquelas condições, com o corpo
febril, o frio da manhã e sem fazer o desayno
- pois naquele horário não havia nenhum restaurante ou
cafeteria abertos - foi muito pesado para mim. Mas sabia que
andando em grupo teria de acatar a decisão da maioria, portanto
não pude reclamar. Também não quis caminhar sozinha meio
indisposta
e descartei a opção de sair depois de todos. Apenas
cobri minha face com a bandana, para me proteger da friagem no
rosto e segui junto com os companheiros de jornada, na descida da
montanha do Cebreiro. Como diz o ditado popular “na descida
todo santo ajuda”.
Quando
já estávamos
próximos do
local de pernoite, a cidade de Triacastela, no
limite do Cebreiro com esse povoado,
ao avistar o vale florido da linda paisagem galega, me despedi
do Cebreiro bradando
em voz alta na direção dos campos de flores : “
I love Galicia ! I love Cebreiro ! “
. O eco das montanhas do Cebreiro repetia : ”
Love Galícia , love Cebreiro “.
Era o meu grito de vitória, eu sentia que estava a caminho
do Graal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigada pela visita! Deixe um comentário que responderei com muito prazer .